O Velho Almaço

quinta-feira, 17 de junho de 2010 às 8:16 PM

O Velho Almaço

por Max de Medeiros[1]

Esta semana reencontrei um velho amigo dos tempos passados. Um cara que me foi bastante útil, mas que agora vive esquecido pelos jovens da geração internet. O bom e velho Papel Almaço, quem se lembra dele? Aquele nosso amigo dos trabalhos escolares, que nos acompanhava até a biblioteca, onde nos debruçávamos sobre os livros para escrever à mão páginas e mais páginas.

Não sei, mas acho que toda crônica tem que ter um ar de saudade, é a nossa inspiração, ou saudade do passado ou saudade do futuro. E quando escrevemos sempre acontece uma coisa legal, colocamos sempre uns óculos para observar o objeto, o tempo e o espaço, e as coisas se revelam de uma forma bastante diferente. Só para constar, escrevo em um editor de texto no computador, não em um Papel Almaço.

Encontrei meu velho amigo em uma escola pública de São Luís. Percebi que grande parte dos alunos da rede pública utiliza os computadores, as lan houses, para realizarem suas pesquisas, mas pelo custo da impressão ainda continuam fiéis ao Almaço.

Mesmo assim, observando os alunos de hoje, principalmente os de escolas privadas, percebemos como as coisas mudaram e como os estudantes ganharam autonomia em todos os sentidos. E isso traz aspectos bons e outros ruins, como quase tudo na vida.

Atualmente, o processo de educação vem se desenvolvendo bastante, principalmente em virtude da introdução da rede mundial de computadores (que termo global, hein!?). Mas, todo processo desenvolvimentistas vem acompanhado de perdas inimagináveis. Talvez essa seja uma idéia romântica dos saudosistas e tradicionalistas, mas nossos companheiros do passado, como o Papel Almaço estão, de fato, sendo esquecidos.

No campo das pesquisas acadêmicas em comunicação, a bola da vez é a discussão da Educomunicação, ou seja, a análise dos processos comunicacionais no processo de ensino-aprendizagem a partir das prerrogativas práticas da Comunicação Social. É curioso quando os campos de conhecimento se interrelacionam e, neste caso, a contribuição para a pedagogia é inegável.

Só que o problema é onde estão nossos alunos, cidadãos com direitos, humanos com necessidades, nessas discussões teóricas?

Fui convidado a monitorar aulas de Educomunicação, mesmo não sendo especialista no assunto, em uma escola pública da cidade, onde reencontrei meu velho amigo. Apesar de ainda um elemento presente desses alunos, o Papel Almaço vem perdendo seu espaço gradativamente. No final das contas, acho que talvez eu seja um romântico tradicionalista ultrapassado e, acima de tudo, um hipócrita, porque também utilizo o computador ao invés do Papel Almaço, inclusive aqui e agora, mas esse processo é bem mais complexo do que parece.

Preciso destacar uma coisa da minha breve experiência com os alunos da rede pública de ensino. De fato, constatei que não existe comunicação no processo ensino-aprendizagem nessa escola pública. As relações dentro da sala de aula são definitivamente estruturadas através de uma verticalização de posições, onde os professores estão no topo, munidos do seu “conhecimento”, e os alunos estão na base, como indivíduos sem conhecimento que têm o dever de digerir o conhecimento ofertado. E os alunos estão condicionados a isso.

Simplificando a discussão, acho que encontrei aqui a problemática para os educomunicadores: estabelecer condições para que a comunicação seja efetivada entre professores, alunos e a comunidade, pois o processo de aprendizagem não pode estar às margens do tempo e do espaço no qual se realiza.

Ainda que talvez tenha encontrado o fio da meada e apesar de ter tentado estabelecer um processo de comunicação horizontalizado entre eu, enquanto professor, e os alunos, descobri logo no segundo dia de aula que não sou educador, pelo menos não na perspectiva escolar e pedagógica. Ser educador, nesse sentido, é uma arte que não se encontra em todos os comunicadores, e eu, definitivamente, não tenho o dom para isso.

Ah, tenho que destacar que minha segunda aula (e última) terminou em uma guerra de bolas de papel incontrolável, dignas daqueles filmes das tardes brasileiras. Mas, sinceramente, espero reencontrar o meu velho amigo Papel Almaço fazendo novas amizades pelas salas de aula do país, das escolas públicas às privadas, convivendo com as novas tecnologias da informação, pois o papel ainda é uma importante ferramenta nesse processo comunicação/educação.



[1] Max de Medeiros Soares, estudante de Comunicação Social e pesquisador na área de Folkcomunicação (Comunicação Popular). Após uma breve viagem pela área da Educomunicação, compreendeu parte das dificuldades enfrentadas pelo sistema de educação brasileiro, que serviram para reafirmar sua vocação pelas pesquisas no campo da cultura popular.